Poema chamado Mapa, de Murilo Mendes, consegue ler as dores de uma geração

Desde que li esse poema pela primeira vez em um livro cheios de poemas dos principais escritores brasileiros, que me apaixonei por cada junção de palavras que o Murilo Mendes conseguiu fazer em Mapa.

Antes de qualquer coisa, como nada vida pode ser perfeito, as últimas palavras entram em discordância com a perfeição que para mim, em humilde expressão de amor e carisma, as últimas frases não o tornam perfeita.

No seu poema, vejo uma expressão de necessidade seguinte e ordinária em precisar manter a estabilidade de um alguém que não vive quem realmente é. 

 E quando chega no momento de enfatizar o dizer que “gosto de todos, não gosto de ninguém”, tenho quase certeza de que há uma evocação sobre a vontade de viver uma vida que não se vive. Entende? Leia e me confirme se não estou louca, por favor!

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Poema Mapa – Murilo Mendes

Me colaram no tempo, me puseram
uma alma viva e um corpo desconjuntado. Estou
limitado ao norte pelos sentidos, ao sul pelo medo,
a leste pelo Apóstolo São Paulo, a oeste pela minha educação.

Me vejo numa nebulosa, rodando, sou um fluido,
depois chego à consciência da terra, ando como os outros,
me pregam numa cruz, numa única vida.
Colégio. Indignado, me chamam pelo número, detesto a hierarquia.

Me puseram o rótulo de homem, vou rindo, vou andando, aos solavancos.
Danço. Rio e choro, estou aqui, estou ali, desarticulado,
gosto de todos, não gosto de ninguém, batalho com os espíritos do ar,
alguém da terra me faz sinais, não sei mais o que é o bem
nem o mal.

Minha cabeça voou acima da baía, estou suspenso, angustiado, no éter,
tonto de vidas, de cheiros, de movimentos, de pensamentos,
não acredito em nenhuma técnica.

Estou com os meus antepassados, me balanço em arenas espanholas,
é por isso que saio às vezes pra rua combatendo personagens imaginários,
depois estou com os meus tios doidos, às gargalhadas,
na fazenda do interior, olhando os girassóis do jardim.

Estou no outro lado do mundo, daqui a cem anos, levantando populações«
Me desespero porque não posso estar presente a todos os atos da vida.

Onde esconder minha cara? O mundo samba na minha cabeça.
Triângulos, estrelas, noites, mulheres andando,
presságios brotando no ar, diversos pesos e movimentos me chamam a atenção,
o mundo vai mudar a cara,
a morte revelará o sentido verdadeiro das coisas. Andarei no ar.

Estarei em todos os nascimentos e em todas as agonias,
me aninharei nos recantos do corpo da noiva,
na cabeça dos artistas doentes, dos revolucionários.

Tudo transparecerá:
vulcões de ódio, explosões de amor, outras caras aparecerão na terra,
o vento que vem da eternidade suspenderá os passos,
dançarei na luz dos relâmpagos, beijarei sete mulheres,
vibrarei nos cangerês do mar, abraçarei as almas no ar,
me insinuarei nos quatro cantos do mundo.

Almas desesperadas eu vos amo. Almas insatisfeitas, ardentes.
Detesto os que se tapeiam,
os que brincam de cabra-cega com a vida, os homens práticos…

Viva São Francisco e vários suicidas e amantes suicidas,
os soldados que perderam a batalha, as mães bem mães,
as fêmeas bem fêmeas, os doidos bem doidos.

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3 Responses

  1. 16/01/2024

    […] do poema Mapa, esse também cativou minha admiração. E como amante de boas histórias, espero fazer o mesmo com […]

  2. 20/03/2024

    […] LEIA AINDA: Poema chamado Mapa, de Murilo Mendes ☕ […]

  3. 28/03/2024

    […] e merece ser lida por quem ama uma boa literatura cheia de arte e história. Assim como em seu poema chamado Mapa, você também vai se encontrar nesse a […]

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